Imaginem-se
Em 1994 publiquei no jornal Orpheu do Liceu D. Pedro V um pequeno texto de incentivo à leitura de Os Maias, ainda hoje um dos meus romances preferidos. Fica aqui reproduzido o texto, a propósito de só hoje ter descoberto que há anos que Os Maias se tornou facultativo no ensino público.
Imaginem-se
Não interessa de que área somos ou aquilo de que gostamos. Todos os anos, inevitavelmente, estudamos “Os Maias”.
Não interessa agora falar das características das personagens, do espaço, do tempo, da intriga ou do desenvolvimento da acção, uma vez, que para isso teremos muito tempo nas aulas de Português (há quem pense que sim e há quem pense que não). Importa sim pensarmos porque vale a pena ler “Os Maias”. É uma questão de atitude, como tudo na vida. Claro que é uma seca ler um livro de mais de 700 páginas se estivermos a pensar que nesse momento poderiamos estar a fazer outra coisa qualquer, provavelmente muito melhor. Sim, claro que poderiamos estar no café a beber uma bica ou a fumar um cigarro, ou embevecidos a olhar para a mota comprada há 3 meses, ou a fazer sabe-se lá o quê. Quando queremos ler “Os Maias” temos de pensar que naquele momento queremos ler um livro; não interessa o que ouvimos dizer, interessa o que podemos ler.
Em tudo é a atitude que domina. Abram o livro à vossa procura, pode ser que nas velhas estradas para Sintra ou nas corridas de cavalos consigam imaginar algo [de] que verdadeiramente gostem. Pode ser que a Gouvarinho ou o Carlos não sejam só personagens.
Comecem a ler este livro sem ideias feitas. Construam-nas enquanto o lêem. Leiam para vocês, como se fossem os Carlos e as Marias Eduardas da Lisboa queirosiana e o livro será vosso. Assim quando o acabarem de ler saberão exactamente porque o odiaram ou porque gostaram tanto dele. A explicação será vossa. E “Os Maias” não serão apenas um calhamaço escrito por um tipo chamado Eça de Queirós.