Comics going digital
Há uns anos, devido à crescente falta de espaço, decidi que iria, apenas na ficção, começar a comprar livros em edições digitais. Tenho um velho ipad 2, que praticamente já só uso para ler, e por isso podia dar-lhe mais algum uso. Isto foi há uns três ou quatro anos e até agora não tenho mais do que seis títulos e na verdade nem sempre cumpri a minha própria regra pois os preços bastante baixos face aos títulos em papel falaram mais alto. A experiência tem sido estranha e, vista a partir do presente, parece-me que reservei para a leitura digital escolhas de segunda: comprei o American Gods, a edição do aniversário de 10 anos, mas apenas porque já tenho em papel a edição original. Motivado por esta compra comprei o Anansi Boys, também do Gaiman e que é um spin-off do American Gods, mas que nunca li. Pelo meio comprei o Chariots of the Gods porque estava por um preço ridículo e é um dos livros que inspirou o Stargate, o Stargate, por Deus! Também comprei esse objeto bizarro, Driving Over Lemons, de Chris Stewart, primeiro baterista dos Genesis e que se dedicou à criação de ovelhas na Andaluzia (o livro é sobre esta experiência), além de Secular Philosophy and the Religious Temperament, do Thomas Nagel, e as obras de Pseudo-Dionísio Areopagita. Tudo a preços incrivelmente baixos e por isso pechinchas irresistíveis.
Vendo bem, este conjunto de obras demonstra mais a minha reserva em abraçar a leitura digital do que a minha abertura à mudança para este meio. Na verdade apenas o Guardian, o Times Literary Supplement e (menos) o Economist são leituras digitais regulares, talvez pelo grafismo e pelo tempo de leitura. Há qualquer coisa nos livros em papel, a começar pela desnecessidade de carregamento de baterias e a acabar na facilidade de sublinhar e anotar que continua a merecer a minha preferência. Um certo tributo à história do livro em papel, também, e a tudo o que com ele se relaciona, com lugar de destaque para os lugares onde os guardamos, as nossas bibliotecas pessoais.
Daí que seja com alguma cautela que encaro a minha mais recente ideia de mudar-me para o digital nos comics americanos, pelo menos os da Marvel, que tem uma ótima loja online para edições digitais. Coleciono comics há quase 30 anos embora de forma muito selectiva, escolhendo com cuidado as séries que vou fazendo e comprando. Mas o espaço é cada vez menos e os preços pesam, sobretudo se queremos diversificar um pouco as coleções, mesmo para quem quase nunca sai do submundo Wolverine. Recentemente, a propósito do regresso deste super-herói Marvel, que está iminente, dei por mim a ponderar dedicar-me à leitura digital dos meus comics, reservando o papel para graphic novels de maior fôlego. Uma vez que é bastante provável que com o regresso de Wolverine terminem as duas séries que carregam a sua herança - a All-New Wolverine e a Old Man Logan - e que eu acompanho em papel, achei que poderia experimentar com a nova série X-23 abraçar o formato digital (série em que Laura Kinney deixa de ser o Wolverine e volta a ser a original X-23, preparando, provavelemente, o regresso de Logan). Gostei bastante da experiência. A qualidade da cor não perde nada, a leitura é fácil (mesmo quando às vezes tenho de mudar a orientação do ecrã) e é mais barato. Além de que nos comics é muito fácil ler quatro ou cinco de uma assentada, o que metido dentro de um ipad poupa espaço, mesmo sendo os comics fininhos. É por isso aterradora a tentação de mudar para o digital de forma regular no que diz respeito a comics. Deixar de ter os livros todos arrumadinhos ali na estante, alguns dentro das suas capas protetoras. Mas parece-me que é o caminho a seguir, reservando o papel para edições especiais. Por exemplo, finalmente completei a minha coleção de paperbacks do Lucifer. Contudo, para duas ou três séries que se acompanhem em simultâneo, regularmente, e que podem durar anos ao longo de dezenas de números, ter tudo no ipad para leitura confortável e, ao mesmo tempo, poupar dinheiro e espaço, parece ser uma excelente opção. Esperemos que o sentido estético não a rejeite.