Diogo Freitas do Amaral
A primeira memória que tenho de Diogo Freitas do Amaral é distante do homem e distante no tempo. Um slogan gritado mil vezes, na campanha das presidenciais de 1986, "para a frente, para a frente, Portugal, com Freitas do Amaral". Eu tinha 9 anos e só me lembro de ir festejar a vitória do outro candidato, Mário Soares, com os meus pais, para a rua. Mas a memória desse embate ficou e ficou a memória de Freitas do Amaral. Para além dos reencontros em livros e enciclopédias durante o ensino secundário, o meu marcante reencontro com o Professor Freitas do Amaral seria em 1995 quando entrei pela primeira vez na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Nessa altura colocavam-se, caídos sobre cada um dos dois últimos pilares do átrio principal da Faculdade, uns longos rolos de papel pardo com os resultados de uma votação de popularidade de professores e assistentes (quem faria isto? A AAFDL? Creio que sim). Impressionou-me que esse nome que guardara na minha memória das eleições contra Mário Soares, que tinha aprendido ser o líder do partido mais conservador do país estivesse ali no lugar cimeiro dos professores mais votados. Não demorei muito a perceber porquê. Embora me tenha desencontrado do Professor Freitas do Amaral por um ano, ficando o Professor João Caupers a suceder-lhe na regência de Direito Administrativo, com a sua partida para a fundação e direção da Faculdade de Direito da Universidade Nova, rapidamente percebi, quando cheguei ao segundo ano do curso e tomei contacto com o seu Manual de Direito Administrativo, que Freitas do Amaral era um magnífico jurísta e pedagogo. O seu Manual foi um contributo decisivo para me ter apaixonado por Direito Administrativo, o ramo de Direito que cultivo acima de todos até hoje. Depois do Manual, ao longo dos anos, fui lendo a sua restante obra jurídica e pude perceber quão importante foi o seu labor e a sua obra para assegurar a continuidade de uma importante tradição de Direito Público, em especial administrativo, que havia surgido em Lisboa com a criação da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa no início do século XX. Não só o Professor Freitas do Amaral assegurou a transição do magistério e da obra do Professor Marcello Caetano como ajudou depois à criação da escola de Direito Administrativo da Faculdade de Direito da Universidade Nova. A propósito desta iniciativa tive o privilégio de o entrevistar para o jornal da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, creio que em 1996. Lembro-me de ficar impressionado com o carácter progressista que ambionava para o novo curso e com a energia que colocava no trabalho que o esperava. Só por isto, entre tantos feitos de vulto, a minha admiração por ele é enorme e ainda hoje gosto de ler as páginas luminosas do seu direito administrativo, quer concorde ou não.
A última vez que com ele falei foi, contudo, sobre Direito Constitucional. Numa conferência organizada na FDUL por ocasião dos 40 anos da Constituição e em que o Professor Freitas do Amaral foi um dos oradores, pedi-lhe a opinião sobre um artigo que estava a escrever sobre os poderes presidenciais aquando da utilização da famosa norma de demissão do Governo para assegurar o regular funcionamento das instituições. Desta vez já não fiquei impressionado com os ótimos conselhos que me deu num tema com pouco terreno firme. Era o que esperava do Professor. E fico contente, apesar de tudo, de, mesmo com a sua partida, podermos ficar com a sua magnífica obra, que lembra também um professor sempre atento e disponível.