Da educação e da participação política
Ontem, a convite do meu colega e amigo Miguel Prata Roque, tive a oportunidade participar numa tertúlia da Secção de Lisboa Oriental do PS, intitulada "Política às Terças" e subordinada ao tema "Socialismo de cartão, Socialismo de coração". A outra convidada foi a Isabel Moreira.
Eu representava o "socialista de coração", por oposição, à Isabel e à esmagadora maioria da assistência, bastante numerosa, "socialistas de coração e de cartão", que, não obstante o frio, acorreram à livraria Barata, na Av. de Roma.
Devo dizer que foi um dos eventos políticos em que já participei que mais gozo meu deu. Com os anos dou cada vez mais importância à micro-política e, sobretudo, ao papel de formação, discussão e divulgação de ideias políticas, que cabe aos partidos e de que estes se têm demitido nas últimas décadas. Os partidos devem dar o exemplo no que diz respeito à geração e apoio de "grassroots movements", movimentos que a partir de problemas e questões quotidianas sejam politicamente enformadas e informadas.
Se os partidos tem por privilégio constitucional o monopólio do poder político nacional (por enquanto, pelo menos) deviam retribuir este privilégio com a formação e expressão de um pensamento político-ideológico que levasse as pessoas a formarem ideias pelas suas próprias cabeças a partir dos problemas com que se confrontam.
Bem sei que cada vez temos menos tempo e que Portugal ainda está a recuperar de 50 anos que mataram tudo o que cheirava a movimentos associativos espontâneos, que pudessem mediar entre o indivíduo e o Estado. Mas a verdade é que desde 1974 os partidos se têm demitido de fazer a sua parte no campo da discussão e integração política. Diga-se que o resto do Terceiro Sector em Portugal confirma esta pobreza, que não é apenas da participação política.
A importância de prepararmos as pessoas para pensarem, pensarem pelas suas cabeças, confrontarem os seus políticos, os seus jornalistas e serem capazes de por si próprios e em conjunto tratarem dos seus assuntos e fiscalizarem aqueles que os representam é o maior bem político. E é justamente aquele que os partidos mais esquecem.
A 2 meses e pouco das eleições europeias (mas o cenário repete-se em todas as eleições) eu gostaria que o partido em que ideologicamente ainda me vou revendo já estivesse a promover em todas (sublinho, em todas) as suas secções, continente e ilhas, sessões de esclarecimento sobre o que é a União Europeia, o Euro, como funcionam as instituições comunitárias, o nível de devolução de poder que constitucionalmente entregámos à Europa, etc. Gostava que isto estivesse a ser feito há 6 ou 9 meses, para que agora, a 2 meses e pouco das eleições, conhecidos os candidatos do partido, as pessoas, motivadas pelas discussões, pelas informações adquiridas sobre a Europa, sobre o seu papel na Europa, pudessem questionar os candidatos, terem vontade de conhecê-los, saber se propõem e defendem muito do que acham - munidos de informação - que deve ser feito pelos deputados portugueses ao parlamento europeu. Nada disto que aqui escrevi aconteceu. Nada. E isto é tão-só o que devia ser, em democracia, o papel primeiro dos partidos. Depois, então, ir a eleições.
John Adams, autor da Constituição da Commonwealth de Massachusetts, a que está vigente por escrito há mais tempo, escreveu isto:
Chapter V, Section II.
The Encouragement of Literature, etc.
Wisdom, and knowledge, as well as virtue, diffused generally among the body of the people, being necessary for the preservation of their rights and liberties; and as these depend on spreading the opportunities and advantages of education in the various parts of the country, and among the different orders of the people, it shall be the duty of legislatures and magistrates, in all future periods of this commonwealth, to cherish the interests of literature and the sciences, and all seminaries of them; especially the university at Cambridge, public schools and grammar schools in the towns; to encourage private societies and public institutions, rewards and immunities, for the promotion of agriculture, arts, sciences, commerce, trades, manufactures, and a natural history of the country; to countenance and inculcate the principles of humanity and general benevolence, public and private charity, industry and frugality, honesty and punctuality in their dealings; sincerity, good humor, and all social affections, and generous sentiments among the people.
Foi em 1780. Já podíamos ter aprendido qualquer coisa.