O revolucionário tranquilo
para a Filipa
Apesar de já o conhecer há quase dez anos quando nos começamos a encontrar fortuitamente nos corredores da Assembleia da República só então, entre 2005 e 2008, criei a minha própria imagem de Marques Júnior. Até aí conhecera-o por interposta pessoa, a sua filha e minha amiga. A imagem que tinha era, talvez influenciado pela minha própria experiência familiar, a do militar tranquilo, não despojado de paixões, mas que as vivia num espaço contido, orientado. Este entendimento ajudava-me a compreender o mistério do revolucionário tranquilo, que se desenhava perante mim, e que não tinha a certeza de ser verdadeira.
Então, nesses três anos de encontros esporádicos no Parlamento, em que ficávamos à conversa durante alguns minutos, reconstruí a imagem de Marques Júnior e é com essa que vou ficar: a de uma pessoa profundamente tranquila com a necessidade da revolução e apaixonada pelo país que tinha que vir depois. As nossas conversas reflectiam isso: elas oscilavam invariavelmente entre a qualidade das nossas vidas, das nossas famílias e amigos e as venturas e desventuras do país. Na certeza de que ambas são apenas escalas diferentes de uma mesma preocupação: apenas em liberdade faz sentido o resto, todas as demais batalhas, havendo um carácter firme que as suporte. Ser um capitão de Abril pareceu-me, assim, uma decorrência normal deste temperamento. Mesmo se cheia de incertezas e perigos.
Talvez a minha imagem de Marques Júnior não seja imune à amizade que tenho à sua filha, nem ao respeito que tenho pelos militares, mas tenho a certeza que a parte mais importante da memória que dele tenho é a que construí por mim, nestas conversas, e que diz respeito apenas a essa qualidade que admiro: a de revolucionário tranquilo. Mesmo se apenas por fora. Paradoxal, mas determinante.